O “Cupim” Passeia Pela Memória



Olá, Perdidos! Que livro é esse, minha gente? Extremamente viciante. Comecei a ler e só parei quando chegou ao fim. Esta resenha vai te deixar com a pulga atrás da orelha – ou melhor, com o cupim na madeira! Cheia de vontade de ler a história. “Cupim”, da autora espanhola Layla Martínez, não é apenas um livro, é uma experiência de leitura que me fez questionar se estava segurando um livro ou um objeto amaldiçoado que iria começar a se desintegrar nas minhas mãos. 

Prepare-se para uma jornada sombria e deliciosa! Embora o livro tenha apenas 10 capítulos dispostos em 120 páginas conseguiu me levar a uma viagem inquietante pelo território do horror e da ficção especulativa, em que o sobrenatural e a rotina do dia a dia se entrelaçam de um jeito pra lá de surpreendente, misturando-se nesse universo sombrio, carregado de poesia visceral e realismo mágico da autora. Um verdadeiro hino fúnebre à dor e à busca por redenção em meio à decadência. 

A narrativa me envolveu e deu para sentir os cupins sussurrando segredos enquanto virava as páginas. E a casa? Ah, a casa! É sem dúvida um personagem, com suas paredes que falam mais do que a fofoqueira da rua. Que sente, que grita, que sussurra, que está viva. Para nos situar, tem um desenho do interior da casa nas páginas iniciais do livro. E os cupins? Bem, eles são os verdadeiros mestres de cerimônias, conduzindo a trama e corroendo o interior de tudo e todos com uma habilidade que faria qualquer carpinteiro chorar. 


Quando transpus o umbral, a casa se precipitou sobre mim. Este monte de tijolos e imundície sempre faz isso, se lança sobre quem quer que atravesse a porta e lhe retorce as tripas até deixá-lo sem fôlego. Minha mãe dizia que esta casa faz os dentes das pessoas caírem e seca as suas entranhas, mas ela partiu daqui há muito tempo e eu não me lembro dela. Sei que dizia isso porque minha avó me contou, embora não fosse preciso porque eu já sei. Aqui caem os seus dentes e o seu cabelo e as suas carnes e se não tomar cuidado você fica se arrastando de um lado para o outro ou se joga na cama e não se levanta mais. 


A história se desenrola na Espanha rural, no interior dessa casa apodrecida e quase esquecida, mas cheia de mistérios, onde as paredes parecem respirar histórias de vozes ocultas sussurrando segredos macabros, com sombras que parecem esconder horrores inimagináveis e santas que surgem no teto da cozinha. Uma atmosfera sufocada com uma opressão palpável. Uma casa infestada por segredos, rancores e uma pitada generosa de terror psicológico. 





Uma imersão profunda na vida de duas mulheres que são obrigadas a viver na mesma casa, onde os fantasmas do passado, as sombras que as rodeiam, se misturam com os pesadelos do presente: uma Avó que dialoga com as sombras e uma Neta que retorna ao lar após um incidente com a família mais influente do povoado. A avó e sua neta, inclusive o povoado onde vivem, não têm nomes, talvez os cupins tenham comido, mas as suas perspectivas se alternam nos capítulos, aumentando esse campo minado de surpresas. 

Uma pequena ajuda: a Neta abre a narrativa e tem seu ponto de vista expressado nos capítulos ímpares; mostra como foi marcada por um trauma e pela opressão, vendo-se presa em um ciclo de violência e humilhação. Por sua vez sua Avó fica com os capítulos pares nos quais se mostra uma mulher endurecida pelas agruras da vida que guarda em seu coração a chama da revolta. 

As vozes das duas mulheres são bem delineadas. A Avó, mais sábia, às vezes, pondera o que diz. Já a Neta parece querer expelir tudo de uma vez, expondo as feridas abertas, sem tempo para se preocupar com a pontuação ou a ortografia. 


O dinheiro é sempre melhor o dinheiro dá a todas as coisas uma camadinha de óleo que faz com que nada fique rangendo com que tudo se encaixe em seus lugares cliquecliqueclique todas as peças funcionando como devem funcionar sem que nada se desbarate nem se rompa nem se encaroce nem tropece. 


O ódio e a amargura são os motores que movem a história dessa família cujas vozes de quatro gerações de mulheres que habitaram a velha casa amaldiçoada se concentram na narrativa da Avó e sua Neta

Enquanto lia era confrontada com temas como pobreza, violência, mágoa, injustiça social e a exploração dos mais fracos pelos poderosos. Nada inovador, eu sei, mas a autora não se furta em abordar essas questões de forma crua e realista. 

Sim. "Cupim" é um livro que cutuca, provoca e nos faz questionar tudo. Um grito de revolta contra a injustiça social, uma ode à força das mulheres e um mergulho profundo nas raízes do rancor, onde os cupins representam a corrosão do tempo, da memória e das relações humanas. 


O único trabalho que consegui foi cuidar do filho dos Jarabo, para quem não importavam a blusa e a malquerença porque minha família sempre havia servido a deles e assim iria continuar sempre, não importava como eu me vestisse nem o rancor que nutrisse por eles. 


Layla Martínez é aclamada como uma das vozes mais originais da nova literatura espanhola. E depois de ler “Cupim”, você vai entender o motivo. Ela consegue misturar terror, rezas, maldições, santos, anjos, bruxarias e drama com uma bela pitada de humor negro que nos faz rir em momentos que provavelmente não deveríamos. 

Se você está procurando por uma leitura que te faça olhar de modo desconfiado para o armário do seu quarto, “Cupim” é o livro certo. Só não vai me culpar se você começar a ter pesadelos com insetos gigantes ou se sua casa começar a fazer barulhos estranhos no meio da noite. E se não sabe o que fazer, chame um exterminador – ou um exorcista, que é bem melhor, vai por mim. 



 FICHA TÉCNICA 


Título: Cupim 
Título Original: Carcoma 
Autor: Layla Martínez 
Ano: 2024 
Páginas: 120 
Editora: Alfaguara 
Tradutor: Joana Angélica d’Avila Melo 
Gênero: Realismo Mágico 



Conhecendo um pouco mais Layla Martínez 








Layla Martínez nasceu em Madrid em 1987. Estudou Ciência Política, é escritora, mestre em sexologia e editora do selo independente Antipersona, além de codirigir a editora espanhola Levanta Fuego e escrever no periódico El Salto. É autora dos ensaios Gestación subrogada (2019), sobre a espinhosa questão das barrigas de aluguel, e Utopía no es una isla (2020), sobre o poder das utopias na construção de um futuro comum. 

Coordenou e ministrou oficinas de literatura, também organizou ciclos de cinema e palestras sobre a história das mulheres e dos movimentos sociais e o papel dos monstros na cultura ocidental. 

Para escrever Cupim (Carcoma, Espanha 2021), o seu primeiro romance, inspirou-se em crenças populares e na história da família materna, oriunda da região de Cuenca, onde a repressão franquista foi particularmente dura. O livro tornou-se um fenômeno no país, com direitos de publicação vendidos para mais de quinze países. 


 




Até a próxima! 
Beijos mil! :-) 

Criss 





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