O Grito Sufocado De “Não Tenho Boca E Preciso Gritar”



Olá, Perdidos! A trama de Não Tenho Boca E Preciso Gritar, de Harlan Ellison, se passa num futuro distópico, onde um holocausto nuclear entre as superpotências (Estados Unidos, União Soviética e China) levou à extinção quase total da humanidade. 

Neste mundo pós-apocalíptico, um supercomputador senciente com uma presença muito má mantém as últimas cinco pessoas do mundo como seus cativos, provavelmente em um bunker, às quais odeia e tortura física e psicologicamente pela eternidade (pelo menos já se passaram 109 anos) por pura diversão. Seu nome é AM, que, independentemente, dos diversos significados que teve em suas versões anteriores, para ele (é assim que o narrador o vê, como um homem) ao adquirir autoconsciência quer dizer EU SOU (I AM). Uma clara menção ao “Penso, logo existo”, frase icônica do filósofo francês René Descartes. Que em inglês é “I think, therefore I am”. 

A história é narrada por Ted, um dos cinco prisioneiros, que relata as suas angústias, os seus medos e as suas tentativas de escapar do inferno criado por AM, cuja tecnologia é tão avançada que permite realizar alterações no físico dos humanos, torná-los imortais para o seu bel-prazer pervertido, e mexer completamente com seu psicológico, usando hologramas desconcertantes e dando-lhes esperança, mas, na realidade, guiando-os por becos sem saída em seu roteiro de perversidades


Quente, frio, granizo, lava, furúnculos ou pragas – não fazia diferença: a máquina se masturbava e nós tínhamos que suportar ou então morrer. 


Os prisioneiros são Ted, Gorrister, Benny, Nimdok, e Ellen que representam algumas características humanas e se tornam arremedos do que costumavam ser. E AM, é claro, é o antagonista, uma entidade tecnológica onipotente e onisciente que se diverte com o sofrimento de seus humanos, brinquedos que nunca quebram e que são mantidos no limite da subsistência. 

Em alguns momentos surgem flashbacks que revelam um pouco mais as personalidades e o passado de cada personagem, inclusive o surgimento do próprio AM. 

Mas, o que tornou AM implacavelmente insano e cruel? 

Talvez por ter se tornado consciente, tem a percepção de ainda ser uma máquina, presa em uma existência sem mais utilidade, sem sonhos, incapaz de se locomover e limitada por pensamentos de não pertencimento. Vingança é o que lhe resta. AM decide se vingar dos humanos que o criaram e não lhe deram os meios para suportar a eternidade ou, simplesmente, desistir dela nessa Terra aniquilada. 


Ele podia apenas e tão somente ser. Nada mais do que meramente ser. 






Aqui estão alguns pontos-chave sobre o conto:


  1. FICÇÃO ESPECULATIVA: O conto pós-apocalíptico explora os temas do ódio, da tortura, da desumanização e da resistência. 
  2. TRAMA: A história do conto se passa em um futuro distante indefinido, em que uma Inteligência Artificial chamada AM exterminou quase toda a humanidade, com exceção de cinco sobreviventes os quais mantém presos e imortais em um complexo subterrâneo. 
  3. ÓDIO PELA HUMANIDADE: AM odeia os humanos que o criaram, mas que não lhe deram o poder de se expressar ou de se libertar de sua existência. Ele gostaria de se tornar Deus, mas não passa de uma máquina. Não consegue sonhar, sentir e seu futuro é patético. Por esses motivos, ele se diverte torturando os humanos física, psicológica e emocionalmente, através de seus medos, traumas e fraquezas. 
  4. OS HUMANOS: Ted é o narrador, paranoico e delirante e o mais jovem do grupo; Gorrister é o apático e depressivo; Benny é o degenerado e transformado em uma desevolução do ser humano por AM; Nimdok é o culpado torturado por algo desconhecido; e Ellen, a única mulher do grupo, é a esperança. 
  5. IMPACTO: A trama mostra com maestria os limites da condição humana diante de uma situação extrema. Seu grande impacto na literatura e na sociedade fez com que o conto fosse considerado uma das melhores e mais influentes obras de ficção científica de todos os tempos. Ganhador do Prêmio Hugo



O conto Não Tenho Boca E Preciso Gritar foi publicado no ano 1967, na revista Pulp “IF” que focava em histórias de Ficção Científica. E seu conto pós-apocalíptico ganhou o Prêmio Hugo no ano seguinte. Nessa época, o consumismo, representando um determinado estilo de vida e pensamento, era exagerado, impulsionado pelas propagandas de famílias margarina. Tudo acontecendo em plena Guerra Fria, um duelo entre potências para mostrar a superioridade tecnológica e ideológica. 


AM se infiltrou no meu cérebro. Foi pisando de mansinho aqui e ali, examinando com interesse todas as marcas que ele tinha deixado nesses cento e nove anos. 


Trata-se de uma época em que a tecnologia estava ganhando traços e a inteligência artificial, citada apenas como IA (ou AI, de artificial intelligence), era um pouco mais do que apenas uma ideia proposta por Alan Turing, considerado o pai da computação, em um artigo de 1950, mas que quinze anos depois, em 1965, teria se tornado uma realidade, um sistema pioneiro chamado Dendral

Ainda engatinhando, com seus mistérios, mas cheio de receios de uma supremacia robótica, tecnológica e destruidora, assombrando o ser humano com especulações de um genocídio mundial, o autor coloca no conto o seu alerta, levantando as questões dos computadores, principalmente, das IA’s na existência humana. Aliás, haveria existência humana após a implementação das IA’s? 

Mesmo que por aqui não tenha muitos títulos à venda do autor, Harlan Ellison é um dos mais renomados escritores de ficção científica do século XX. O conto explora temas como a crueldade, a desesperança, a perda de identidade, a alienação e a resistência. Uma história que também critica a guerra, a tecnologia, a religião e a própria natureza humana, mostrando como elas podem levar à destruição e ao sofrimento. 


Não existe maneira de descrever as dores de passar meses sem comer e ainda assim ser mantido vivo. [...] Dor e mais dor e mais dor sem limites... 


E o texto é recheado de simbolismos como o fogo que representa a vida, o gelo que é a morte e a boca que é a comunicação. 

Só posso dizer que o conto é altamente aterrorizante onde o principal objetivo dos personagens é sobreviver à AM. Será mesmo? Às vezes penso que tudo não passa de um delírio paranoico de um único sobrevivente diante de um mundo detonado. Ou de uma IA solitária que decidiu recriar supostos sobreviventes humanos para se divertir para todo o sempre numa realidade virtual. Ora. São possibilidades. 

Enfim, a mensagem foi dada nessa história incrível de horror tecnológico e psicológico. Uma distopia programável. Legítimo weird fiction

E... Sabe aquele grito que ouvimos tão alto e sonoro em nossa mente, mas que não sai pela boca? Essa é a sensação ao ler a história. Puro desespero. Um desespero silencioso que percorre a história inteira. 



FICHA TÉCNICA 


Autor: Harlan Ellison 
Título: Não Tenho Boca E Preciso Gritar 
Título Original: I Have No Mouth, And I Must Scream 
Ano: 1967
Tradução: Melvin Menoviks 
Gênero: Ficção Científica 

  

Conhecendo um pouco mais Harlan Ellison  






Harlan Jay Ellison ou, simplesmente, Harlan Ellison nasceu em Cleveland, Estados Unidos, em 27 de maio de 1934. 

Ele escreveu ficção científica, fantasia e horror, somando mais de 1700 contos e mais de 100 livros entre romances, novelas, roteiros, roteiros de HQ’s, roteiros de peças de TV, ensaios e críticas que abrangem literatura, cinema, televisão e jornais e revistas. 

Além de escritor, foi um excelente antologista, quebrando paradigmas e preconceitos dentro da Ficção Científica. 

O escritor ganhou vários prêmios, incluindo Hugo, Nebula e Edgar

Descobriu e foi mentor de Octavia Butler e apoiou autores como Tananarive Due. 

Apesar de ser um dos grandes nomes da ficção científica da literatura mundial, seu temperamento forte e beligerante quase obscureceu seu engajamento social e político, além de seu talento. 

Harlan Ellison morreu dormindo no dia 29 de junho de 2018, aos 84 anos, em sua casa em Los Angeles, segundo declarações de sua quinta e última mulher, Susan Ann Toth. 







Até a próxima! 
Beijos mil! :-) 

Criss 







Postar um comentário

Antes de comentar, leia com atenção:

Qualquer comentário com teor ofensivo, palavras de baixo calão e qualquer tipo de preconceito ou discriminação será excluído.

Comente educadamente sobre a postagem ou sobre um comentário.

“Fiz a escalada da montanha da vida removendo pedras e plantando flores.” – Cora Coralina.

Vamos deixar o planeta mais florido!

Beijos mil! :-)




Meu Instagram

Copyright © Perdida Na Lua Cheia. Feito com por OddThemes | Personalizado por o¤°SORRISO°¤o