Olá, Perdidos! Dezembro. Último mês do ano. Natal. Para muitos é o momento de comemorar o nascimento de Jesus, a vida e a família. Amigos e familiares se reúnem para a ceia com o Peru de festa e a troca dos presentes que aguardam sua vez de brilhar ao saírem debaixo da árvore de Natal, decorada com lindos enfeites, bolas, Noéis e pisca-piscas.
Mas, para o narrador de Um Conto De Natal, de China Miéville, o Natal não é mais o mesmo. Vamos entender o motivo.
É chegado o Natal e nada mais natural do que um pai desejar proporcionar uma festa de Natal cheia de pompa e com tudo a que se tem direito para sua filha pela primeira vez. Não é mesmo?
Algo impossível para ele imaginar, o que dirá realizar. Mas quando ganha ingressos para a maior festa natalina do país, ele, finalmente, vai ser capaz de mostrar a sua filha adolescente como costumava ser a verdadeira celebração de Natal, realizada em sua época.
Contudo no caminho para a tão almejada festa, muita coisa acontece. Será que o narrador, esse pai tão orgulhosamente sortudo, e sua filha chegarão a tempo dos festejos de Natal? Ooops! Quer dizer, Natal®.
A história se passa em Londres num futuro indefinível após o Ato de Natal que fez com que o Natal se tornasse uma marca registrada ® pertencente a uma empresa, a NatavidadeCo. Você leu certo: marca registrada. Logo, as pessoas que não têm ações da empresa não podem celebrar o Natal de forma plena e legalizada. Isso mesmo.
Qualquer menção ligada a qualquer produto natalino tem seu direito patrimonial garantido. O nome, a festa, montar a árvore, pendurar as meias, os enfeites, as comidas, as bebidas, as canções, usar a roupa de Papai Noel, os papeis de presente e até mesmo colocar os presentes embaixo da árvore podem ser usados se forem pagas todas as taxas que custam um preço nada módico, é claro, aos detentores de seus direitos. Tem até uns concorrentes mais baratinhos, mas não é a mesma coisa.
[...] alguns deles pareciam jovens demais para lembrar da vida antes do Ato de Natal®) de uma antiga tradição.
No conto o espírito natalino é comercializado e os menos afortunados até podem receber, somente através de um reles sorteio, as entradas para participar da “verdadeira” comemoração, se tiverem sorte.
É claro que onde há desigualdade e uma certa opressão há também aqueles que se opõem. E quando pai e filha se encaminham até o prédio da NatavidadeCo para sua festa encontram muitos natalinos radicais em suas mais variadas manifestações.
Tem as sNOwMEN, grupo de natalinas feministas radicais; os Pequenos Ajudantes de Papai Noel para aqueles com até 1,55m de altura; os Red & White blocs prontos para criar baderna, cujo nome remete ao famoso grupo de manifestantes Black bloc; o Partido Cantor Radical dos Homens Gays que cantam pelo Natal do Povo; e até os Muçulmanos Pelo Natal. Todos protestam para poder celebrar um Natal livre e totalmente do povo. Enquanto isso, a polícia, ou seja, o Esquadrão Natividade tenta silenciar os provocadores com seus cassetetes.
Aquele pessoal era louco! Não que eles não tivessem boa intenção, mas aquilo não era jeito de conseguir as coisas. Tudo o que eles iam conseguir era causar encrenca para todo mundo. A polícia ia chegar ali a qualquer momento.
China brinca de forma irônica não só com a privatização e a comercialização do espírito natalino como também com a repressão policial e os grupos de manifestantes.
Adorei o conto. Muito relevante. Mostra duras críticas sociais e uma breve análise do mundo que está cada vez mais superficial e ganancioso.
Corporações cada vez mais nos cercam pegando isso e aquilo em prol de uma manutenção séria ou de um bem maior. Mas, o que realmente vemos são essas empresas querendo lucrar e nada mais.
Acha que estou exagerando? É só fechar os olhos que pensamos de imediato na privatização e na elitização do futebol (que até mesmo no conto surge como Futebol®) e do carnaval. Viraram fonte milionária de renda. E o que falar da biopirataria na Amazônia com seus recursos volta e meia sendo levados para fora do Brasil?
Já faz tempo que eu pedi / Mas o meu Papai Noel não vem / Com certeza já morreu / E a Internacional / É tudo que a gente tem.
Foi meu primeiro contato com o autor e gostei muito. O conto é agradável, divertido e nos propõe refletir sobre as mudanças do mundo a nossa volta. O final é interessante e deixou um gostinho de ‘quero mais’.
A ideia é muito criativa. Num mundo capitalista em que tudo pode ser privatizado nem o Natal parece escapar. Já imaginou encontrar seu amigo na rua e não poder desejar-lhe Feliz Natal por ser uma infração e ser multado, afinal o Natal passou a ser uma marca registrada. É melhor esquecer o assunto antes que algum empresário ou governante ache a ideia incrivelmente maravilhosa e acrescente ® ao feriado.
Shhhhh! {sussurro} Feliz Natal!
Autor: China Miéville
Título: Um Conto De Natal
Título Original: ‘Tis The Season
Ano: 2018
Gênero: New Weird
Conhecendo um pouco mais China Miéville
O britânico China Miéville é um importante expoente da literatura conhecida como New Weird, uma espécie de híbrido de ficção científica, fantasia e horror.
Ele ganhou o Hugo Award, o prêmio mais importante dedicado aos livros de ficção científica, e recebeu três vezes o Arthur C. Clarke Award, premiação para o melhor livro do ano de ficção científica publicado no Reino Unido, duas vezes o British Fantasy Award para romances de fantasia, e uma vez o World Fantasy Award, prêmio dado a cada ano para a melhor obra de ficção científica, além de várias outras honrarias.
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