Uma comédia romântica, deliciosa e bem clichê. Foi isso que eu pensei no decorrer da leitura de Anexos, de Rainbow Rowell: este livro está me lembrando um filme de comédia romântica. Mais precisamente “Mensagem para Você”, com Meg Ryan e Tom Hanks, de 1998, que inclusive, trata de um relacionamento amoroso que surge através da troca de e-mails diários (algo inédito para a época), onde os dois não se conhecem pessoalmente.
Assim como o filme, que até é mencionado no livro, Anexos não tem grandes surpresas.
– Se isso fosse um filme com Meg Ryan e Tom Hanks – disse Lincoln –, eu apenas beijaria você, provavelmente no meio de uma frase. Isso ajeitaria tudo.
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A história do livro se passa em 1999, durante a polêmica da época sobre o famoso Bug do Milênio (ou Bug Y2K) e o medo de que, com a virada do milênio, todos os computadores reconhecessem o ano 2000 como 1900, causando uma desordem no sistema econômico mundial. Loucura!
E com receio de um caos generalizado, o recente departamento de informática do jornal The Courier (um dos últimos a se render a informatização) contrata Lincoln O’Neill como um misto de técnico de informática, programador e agente de segurança da Web. Mas, a verdadeira função para o qual foi contratado é vigiar e monitorar os e-mails dos funcionários em busca de qualquer mensagem subversiva com relação aos chefes ou que fuja às funções exclusivas do trabalho e enviar uma advertência ao infrator.
<<Jennifer para Beth>> Quem você quer que ele seja?
<<Beth para Jennifer>> Na maior parte do tempo? Acho que quero o músico de cabelo maluco. O cara que te acorda às duas da manhã para recitar o poema que ele acaba de escrever na sua barriga. Quero o menino com olhos de caleidoscópio.
Até que um dia o programa que filtra essas mensagens alerta para os e-mails de Beth e Jennifer. Beth Fremont e Jennifer Scribner-Snyder são amigas e trabalham no mesmo jornal como crítica de cinema e editora, respectivamente. Todos na redação sabem que pela política da empresa suas mensagens estão sendo monitoradas, mas Beth e Jennifer, simplesmente, não dão a mínima importância e continuam com suas “conversas” diárias.
E são esses e-mails pessoais (de muito papo fiado!) trocados entre as duas na hora do trabalho que salvam as madrugadas tediosas de Lincoln que acaba se tornando íntimo delas, sem elas terem a menor ideia disso, é claro. Lincoln transforma-se numa espécie de voyeur ao não emitir uma advertência para ambas e continuar lendo suas mensagens. Afinal, são essas conversas alegres e divertidas que fazem Lincoln se sentir vivo de verdade. Não só vivo, como cada vez mais interessado e apaixonado por Beth.
Lincoln não era capaz de explicar, nem para si mesmo, por que ele se importava tanto com ela. Ela e Jennifer eram ambas engraçadas, ambas carinhosas, ambas espertas como elas só. Mas a sagacidade de Beth sempre o pegava.
A cada mensagem, Lincoln conhece a realidade e a personalidade das amigas. Beth namora há anos um guitarrista bonitão de uma banda de rock e parece estar presa num relacionamento que não vai a lugar nenhum. Já Jennifer vive um casamento feliz, mas apavorada e paranoica com a ideia de ter um bebê.
Enquanto Lincoln, um rapaz calmo e contido, continua sua vidinha sem graça morando na casa de sua mãe, mantendo conversas com sua irmã Eve, visitando os amigos com quem joga Dungeons & Dragons desde a faculdade e tendo flashbacks de sua primeira paixão que também foi sua primeira desilusão amorosa. Mas, algo começa a mudar nele. Esses e-mails começam a provocar mudanças nele. As experiências trocadas pelas amigas e o fato dele saber que Beth o chama de Meu Cara Fofo, a despeito de ter namorado, o despertam para a vida e fazem com que ele amadureça como pessoa. O que só aumenta o seu conflito interno sobre a indiscrição (para dizer o mínimo) de ler os e-mails muito pessoais entre sua amada Beth e sua melhor amiga.
Lincoln havia dito a si mesmo, o tempo todo, que era OK fazer o seu trabalho (que era OK ser um intrometido e bisbilhoteiro profissional), desde que não houvesse nada de voyeurístico a respeito. Desde que ele não desfrutasse das intromissões e bisbilhotices.
Mas agora ele estava desfrutando.
E, agora?
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Rainbow Rowell criou em Anexos uma trama que aborda nas entrelinhas as dificuldades enfrentadas pelas pessoas ao chegarem à vida adulta e que muitas vezes não seguem pelo caminho sonhado quando são mais jovens. Lincoln, por exemplo, tinha feito uma lista no Ensino Médio e, apesar dos anos que se passaram, não via alterações nos rumos que sua carreira e sua vida seguiam. Preso num emprego que odiava e ainda morando com a mãe superprotetora, ele se sentia estagnado. E quantas vezes nos sentimos assim? Dá até vontade de dar um belo chute no balde, não é mesmo?
Ele rira então, mas agora aquilo não parecia tão engraçado. Talvez fosse ali que ele estivesse preso. No abismo de tristeza.
A história intercala os capítulos (curtinhos) com as rotinas de Beth, Jennifer e Lincoln. E acompanhamos o crescimento gradual de Lincoln que, lendo diariamente os e-mails das duas amigas, acaba tornando-se mais comunicativo e modificando sua vida para melhor. Na verdade, todos os personagens evoluem no decorrer da história. Beth e Jennifer passam por situações bem difíceis e acabam tomando decisões doloridas, mas necessárias, que fazem com que a vida delas mude radicalmente e cresçam como pessoas. Mas, sem dúvida, as transformações em Lincoln são as mais gritantes.
– Lincoln? – chamou ela.
– Sim?
– Você acredita em amor à primeira vista?
Ele se forçou a olhar para o rosto dela, para seus olhos bem abertos e a testa ansiosa. Para sua boca insuportavelmente doce.
– Não sei – disse ele. – Você acredita em amor antes disso?
Entretanto fica uma questão e Lincoln se vê num beco sem saída: como dizer a mulher que ama que se apaixonou por ela lendo e relendo seus e-mails pessoais? Haveria futuro em um relacionamento amoroso com Beth depois de ter invadido a intimidade de seus e-mails sem ela saber, mesmo sendo este seu trabalho no jornal? Manter segredo sobre essa situação seria uma opção viável? Para um sujeito de boa índole como ele, a verdade é a única salvação, ou não!? E o que faríamos se acontecesse algo parecido conosco? Será que seguiríamos em frente, pois era apenas trabalho, ou enfrentaríamos o mesmo dilema de Lincoln?
Foi o primeiro livro que li da Rainbow e achei legal – leve e suave. Gostei do fato do enredo se passar em 1999 e com todo burburinho envolvendo o Bug do Milênio, embora o panorama que serviu de pano de fundo não tenha influenciado em nada a história. Uma pena.
A escrita da autora flui muito bem, além de ser envolvente, e, convenhamos, os e-mails trocados entre Beth e Jennifer são maravilhosos e a maioria das vezes, hilários, principalmente os de Beth. Independentemente de nos depararmos com situações mais sensíveis e dramáticas, como a narrativa de Lincoln, que muitas vezes é sentimental, há vários momentos bem-humorados, dignos de boas risadas. É impossível não se divertir. E tudo isso tornou a leitura muito agradável e muito fofa.
Tire o peso das costas e relaxe. Leia o fofo Anexos.
FICHA TÉCNICA
Título: Anexos
Título Original: Attachments
Autor: Rainbow Rowell
Ano: 2014
Páginas: 368
Editora: Novo Século
Gênero: Romance (Chick-Lit)
Tradutor: Márcia Men
AUTOR
A escritora americana Rainbow Rowell nasceu em Omaha no dia 24 de fevereiro de 1973. Casada e mãe de dois filhos, ela escreve livros do tipo jovens-adultos e adulto contemporâneo.
Em 2011, seu primeiro romance, Anexos, foi publicado e recebeu ótimas críticas. Seus livros seguintes, Fangirl, Eleanor & Park, Ligações e Carry On só vieram consolidar o talento de Rainbow. Todos já foram publicados no Brasil.
Até a próxima!
Beijos mil! :-)
Criss
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